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LEONI MARGARIDA SIMM

A Luta de Leoni começou em 2001, ao ser diagnosticada com câncer de mama metastático. Após dois anos de tratamento, a doença alcançou os seus dois pulmões, mas nunca atingiu sua vontade de viver. Há 18 anos ela luta contra o câncer de mama e, agora, pela oitava vez, enfrenta a volta da doença. “Já tive medo, não conseguia dormir. Hoje, o que me move é ser ativista pelos direitos das pacientes e admirar quanta beleza tem no mundo!”

Como ela mesma se define, Leoni Margarida, às vezes é flor e em outras é leoa. Uma batalhadora que vem do interior do Rio Grande do Sul. “Eu nasci em uma colônia de agricultores alemães e depois fui para a cidade, para a Capital, e agora já estou pelo mundo”, diz essa gaúcha, nascida na roça, que teve 14 irmãos e desde cedo demonstrou sua força de vontade. A mãe era professora e quando não podia dar aulas, repetidas vezes por ser vítima da violência doméstica, assumia o seu lugar. Tinha na época 10 anos. Como formação escolheu a sociologia. Trabalhou por anos na área de Desenvolvimento de Pessoas, nos Correios, e morou em diversas cidades brasileiras até chegar em Florianópolis.

Em 2001 ela recebeu o diagnóstico de câncer de mama. Em vez de cair na armadilha comum na época de “que alguma coisa tinha feito para merecer aquilo”, ela transformou e continua transformando toda sua experiência em uma missão de vida. Valoriza demais a própria vida e ajuda milhares de pessoas atuando pela causa do combate ao câncer.

Ela encara o câncer como um processo andamento.

“Ter um diagnóstico de câncer é sempre um processo. Em 2001 a palavra nem era pronunciada e representava uma doença inominável. Primeiro, precisávamos vencer o preconceito, nosso e dos outros”.

Sim, Leoni enfrenta o câncer há 18 anos. Agora, em 2019 está encarando a oitava volta da doença. Mas sempre com uma determinação e uma garra impressionantes. “Desde 2001 eu venho enfrentando o câncer. Foi difícil no início, quando aos 44 anos tive que fazer a mastectomia e principalmente por saber que o meu era um tipo de câncer avançado e agressivo, um triplo negativo, com um mal prognóstico. Mas eu estou aqui. Já no ano seguinte, em 2002, eu soube que estava com metástase que atingiu os dois pulmões. Falar em metástase, na época, era como ouvir uma sentença de morte. Então eu comecei a estudar para valer mesmo o câncer e a participar dos tratamentos. Dizia para o meu oncologista médico: ‘Peraí, isso aqui não deu muito certo. Porque tu queres me dar isso?’ e perguntava: ‘Qual é meu tempo de sobrevida livre da doença?’ ‘O que os estudos dizem sobre o tempo de sobrevida global nesses casos?’ Coisas que só se pergunta em pesquisa. Às vezes nem o médico sabia responder: ‘Ôoo Leoni, eu não tenho essas informações aqui.’ Eu respondia: ‘Ah, então eu ainda não vou fazer.’ Quanto mais se sabe mais você ganha confiança. Você tem que ter coragem de não fazer e buscar mais informações. E para começar um tratamento também é preciso coragem. Tem momentos que você tem que parar, se fortalecer e outros em que tem que fazer. Eu dizia para ele e para mim mesmo: ‘Olha, eu vou encarar, vou fazer e vai dar certo!’ São muitas situações que a gente enfrenta e ter esse discernimento sempre me ajudou muito. Tem a ver com a minha personalidade, tem a ver com apoio. Eu tenho muito apoio, da família, dos amigos e também da equipe da AMUCC, que aliás, nasceu no período que eu tive câncer pela primeira vez, em 2001.

E para começar um tratamento também é preciso coragem.

Voltando à metástase no pulmão, Leoni diz: “É o mesmo câncer da mama, mas que achou um outro lugarzinho para morar. Então, desde 2002 ele está morando nos pulmões. E de lá não quer sair. E, já que ele existe, que ele permaneça lá. Ainda bem que não foi para outros órgãos. Isso tem me dado mais chances de tratamento”.

Leoni usa todos os recursos para se cuidar. Inclusive batalha muito pelos direitos de todas pessoas de terem acesso a uma saúde digna. Ela também é adepta da medicina integrativa. “Aprendi muito com tudo isso. Me disciplinei para mudar hábitos, optei por uma alimentação orgânica saudável, eu mesmo procuro plantar e colher o que eu como e quanto mais eu incluo alimentação viva na minha dieta, melhor eu me sinto. Também faço outros tratamentos como a ozionioterapia, sempre procurando experiências mundiais que já deram certo e que se aplicam para pacientes onde “não tem mais nada para fazer”, entre aspas. Mesmo que na medicina tradicional ainda não tivemos grandes avanços, eu não deixo de fazer o que os médicos me indicam como a quimioterapia endovenosa, aquela citotóxica, que mata as células boas e as células más. Não é o melhor, mas é o que está disponível para o tipo de câncer que eu tenho. Surgiram algumas inovações para tratar o câncer triplo negativo como o meu, porém não sabe se dá para aplicar comigo, porque minha doença é muito antiga. E todos os câncer triplo negativo ou são bem recentes ou as pessoas já partiram. Acho que sou mesmo um caso de estudo médico. Eu ganhei essa dádiva de sobreviver a oito episódios de câncer. Me sinto muito grata por isso. A gratidão se estende e inclui a família, os amigos, à mim mesma e a essa beleza que a vida nos dá a todo momento.

Realmente, para agradecer à vida Leoni optou pela luta. Ela atua bravamente pela criação de políticas públicas para defender os direitos quem não tem acesso a nada, coordena grupos, dá aulas, palestras, monta projetos, e se dispõem a participar de um ensaio fotográfico emocionante, como o De Peito Aberto para despertar essa gratidão e vontade de viver em tantas outras pessoas. Ela não para. Faz de tudo para que o número de vítimas seja menor a cada ano. E explica: “tenho uma coceirinha na alma, que não me deixa ficar de espectadora de injustiças”.

Leoni é uma companheira de muitos anos. A conhecemos em 2011, quando estivemos juntos no Encontro de Alto Nível sobre Doenças Crônicas Não Transmissíveis, nas Nações Unidas. Na época, Leoni Simm, da AMUCC, Paula Johns, da ACT (que trabalha no combate ao tabagismo) e eu, Vera Golik, do Projeto De Peito Aberto, fomos selecionadas como Embaixadoras Globais para o combate ao Câncer, pela American Cancer Society, representando o nosso país e integrando a primeira reunião sobre esse tema na sede da ONU, em Nova York, ao lado de 77 representantes dos países-membros. Nós, eu e Hugo Lenzi, e Leoni tivemos uma conexão muito forte e desde lá percebemos que tínhamos muito em comum. Nossa admiração, pela determinação e garra da Leoni só aumenta com o tempo. Era um sonho nosso fotografá-la e entrevista-la para o Projeto De Peito Aberto, mas as agendas não coincidiam. Só agora, na primeira vez que o De Peito Aberto vem a Florianópolis, é que finalmente conseguimos.

“Aprendi muito com tudo isso. Me disciplinei para mudar hábitos, optei por uma alimentação orgânica saudável, eu mesmo procuro plantar e colher o que eu como e quanto mais eu incluo alimentação viva na minha dieta, melhor eu me sinto”.

Não há como não admirar e se emocionar com uma pessoa como Leoni, que segue leoa e flor e, mesmo forte, não nega suas fragilidades, percebendo e se abrindo para enxergar as pequenas belezas da vida. “Quando tu estás muito deprimida alguma coisa te desperta. Eu lembro que recentemente eu estava sentada com meu marido na cozinha, já na oitava recidiva, bem debilitada e falei: ‘Baby (eu o chamo assim), baby, está difícil… Acho que agora estou morrendo” Chorei. Fiquei ali naquela ‘choraminguela’ e dali há pouco olhei para a janela e vi um passarinho que tinha feito um ninho numa caixinha. Parei de chorar na hora e disse: “Baby, um passarinho! Que lindo!!” Passou tudo. Acho que é isso.. não é que passou o medo, não estava livre dos fatos, mas podia ver outras coisa. Acho que essa forma de ver a vida me ajuda muito. Estou ligada no que acontece à minha volta, com outros pacientes, com meus filhos, minha nora, meus netos. Assim me distraio e vejo que tem tanta coisa mais importante que esta doença. Embora ela precise ser encarada com muita seriedade, dá trabalho e a gente desanima às vezes, mas dá para enfrentar”.

Estar engajada na formulação de políticas públicas, no empoderamento das mulheres, à frente de movimentos que deixam as pessoas mais fortes e aptas a lutarem por seus direitos, isso motiva muito Leoni. Mas o que a emociona? “O que mais me toca é poder olhar no olho de um outro paciente e a gente se entender. Isso não é tão simples. Muita gente está à nossa volta, quer nos entender, quer nos dar apoio, mas só quem é paciente sabe o que se sente. Principalmente quem tem um câncer de mama avançado ou metastático, em que paira a sombra da tal ‘sentença de morte’. Comigo foi assim, houve momentos em que eu tive muito medo e chorei muito, me assustei, minha família se assustou, meus amigos se assustaram, mas eu fui sobrevivendo. É importante se cuidar, fazer terapia e começar a olhar para os seus medos. Muitas vezes o medo de morrer é o medo da dor. Por isso eu me emociono quando vejo uma pessoa está vivendo o sofrimento de enfrentar um tratamento tão agressivo. O que me emociona é ter uma profunda interação e empatia com quem passa pelo mesmo que eu. O que me toca bastante é a gente poder dar a mão, chorar junto, concordar que em muitos momentos é muito chato, difícil mesmo. Mas que não é só drama, que é possível rir juntos, e muito. Isso não é negar o que se sente.”

“Teve noites que eu não conseguia dormir, preocupada em morrer e deixar meus filhos. O medo disso e daquilo me invadia. Mas quando tomava coragem de abrir os olhos o que eu via? A lua!! Eu conseguia ver a luz e a sombra. Isso me encantava e espantava o medo. Pelo menos por um tempo. Hoje, eu não deixo de dormir por medo, mas muitas vezes porque lembro que há muita beleza no mundo. E quero estar de olhos bem abertos para elas”.

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